Fui pra praia para me purificar após um longo tempo sem fazê-lo. Andava muito arruaceiro ultimamente e precisava, mais do que nunca, me desintoxicar. Não só fisiologicamente, mas pra botar em ordem a cachola. Tantas coisas aconteceram simultaneamente havia meses, ao mesmo tempo em que me mantinha numa inércia e minha mente estava brecada. E cabeça vazia: oficina do diabo. Mais do que precisar surfar, eu procurava um insight.
O mar ficou flat e logo fiquei ocioso. Gastei o resto da energia andando de skate, porém, devido ao meu bicho carpinteiro, ainda precisava me mexer. Então aproveitei para fazer algo tão banal (banal o bastante para eu nunca ter experimentado), que se tratava de caminhar na beira do mar à noite, quanto tranqüilizante e transcendental e, merda, por que nunca fiz isso antes?! Com a praia deserta, ficava melhor ainda, pois sou misantropo, embora tenha sentido falta de um amigo para eu chorar as pitangas, contudo, precisava ficar a sós comigo. Acima disso, eu precisava mesmo é flanar e a orla sempre me deixou feliz. Olhando pro mar, consigo refletir com ele. Ele, o mar, sempre me ensinou o quê meus pais ou qualquer outro ser humano não conseguiriam. Olhando pra ele, lembrei de todos os prazeres que me deu, de sempre cobrar por isso também, afinal, a gente pega uma onda boa e para voltar, toma uma série na cabeça, ele também tem oscilações de humor e em determinados dias, não está disposto a ser sociável, te ensina a ter paciência em muitos momentos, mas também a pensar rápido e tomar uma atitude logo, briga com você – sim, porque amigos de verdade discordam entre si. Enfim, um professor, um segundo pai, um cicerone, algo poético assim. Alguém que sempre me deu ensinamentos da vida, mesmo que de forma subliminar, talvez me respondesse desta vez. Andei, andei e andei pela beira. Perguntei por que eu tenho que pensar diferente e como conseqüência, sofrer, por que tenho que carregar esse piano, blábláblá... Essa choradeira, aquela fossa que volta e meia nos encontramos. E pra minha surpresa, adivinha qual foi sua resposta... Tchan, tchan, tchan, tchaaaaan... Nenhuma! Não disse nada. Bom, ele nunca falou, porque falaria agora? É assim, é? Vai ficar me devendo essa...
Estava quebradaço e achei que era hora de dormir. Mas meu inseparável companheiro, bicho carpinteiro, ainda me picava. Dei mais uma caminhada, dessa vez com meu irmão, fumei um e fui dormir. Ele disse que ficaria ali fora na sacada da pousada ainda mais um tempo. Não sei pra onde foi meu bichinho, mas desta vez o THC veio pra fazer o papel. Encontrei meu irmão na sacada, de frente para ao mar.
- Ué? Que tu tá fazendo aqui? – perguntou ele.
- O mesmo que tu. Tô chapado e não consigo dormir.
Achei que talvez o mar ainda pudesse me dizer alguma coisa, mas foi à toa. Não deu cinco minutos e meu amigo, o Psicopata (não me perguntem o porquê desse apelido...) apareceu na sacada vizinha. Nos olhamos e rimos. Só os chapados não conseguem dormir à essa hora, pensei.
Ocorre é que essas respostas não surgem obrigatoriamente como uma idéia, ou seja, uma luz que se acende, súbita. Elas podem ser sutis. Ao invés da lâmpada se ligando em cima da cabeça, elas podem aparecer como Tétris, e no lugar certo e ambiente propício, você está com o tino em foco e vai encaixando as peças. Foi voltando pra cidade que meu telefone tocou. A ligação que resolveria uma das minhas angústias. Associando as coisas, percebi que tinha a resposta definitiva. Então percebi também que um grande amigo, mais uma vez, não me deixou na mão. O mar não me respondeu quando perguntei porque queria que eu esperasse. Descobri a solução para minha pergunta. A resposta era “tempo”. Aquele filho da mãe sempre teve razão. Como um legítimo guru, me fez achar a resposta que eu já sabia, mas havia ofuscado com minha ansiedade e impaciência. É, eu é que fiquei devendo essa...
Aquele filho da mãe sempre teve razão.
Publicado em 16/08/2006 no site da Void